Por que o Ministério Público do TCU é contra usar acordo de leniência apenas para salvar empresas
Publicação em 9 de março de 2015
Fotos: EBC e Lula Marques/Folhapress

Augusto Nardes, Luís Inácio Adams e Valdir Simão

Enquanto o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, defende os acordos de leniência para todas as empresas envolvidas na corrupção da Petrobras – afirmando que “o resgate reputacional permite que a empresa possa manter suas atividades“–, o presidente do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, recebe novos argumentos no processo que pretende impedir a Controladoria-Geral da União (CGU) de celebrar acordos com empresas da Lava Jato que não tenham colaborado com o Ministério Público Federal.

O procurador do Ministério Público do TCU Júlio Marcelo de Oliveira reforçou a representação em que o órgão pede a Nardes “seja determinado à Controladoria-Geral da União que se abstenha de celebrar quaisquer acordos de leniência com empresas envolvidas na operação Lava Jato que não tenham já celebrados acordos de leniência com o Ministério Público Federal”.

Em entrevista à Folha nesta semana, o ministro Valdir Simão, da CGU, reafirmou a competência do órgão para firmar acordos na área federal: “Não podemos abrir mão de uma questão que está na lei. Temos que analisar caso a caso”, diz.

Eis algumas alegações do MP junto ao TCU:

1) Contrariamente ao quanto afirmado pela AGU em seus esclarecimentos oferecidos nos autos, não se há que aguardar o cometimento de ilegalidades e irregularidades para que só então possa o Ministério Público de Contas ou o Tribunal de Contas da União agir para salvaguarda do império da lei.

2) A utilidade e necessidade da cautelar pleiteada decorre exatamente do fato de estarmos na iminência de vermos a Controladoria-Geral da União celebrar acordos de  leniência com empresas investigadas na operação Lava Jato sem que tenham trazido às investigações conduzidas pelo Ministério Público Federal informações relevantes,  importantes para o avanço das investigações, que as façam merecedoras do abrandamento de penas decorrente de um acordo de leniência.

3) O acordo de leniência é um instrumento previsto na Lei Anticorrupção como forma de combater a corrupção e não como mera forma de compor com empresas corruptoras uma forma de superar o incidente.

4) A manifesta intenção do AGU de que se utilizem os acordos de leniência com potencialmente todas as empresas envolvidas na operação Lava Jato, independentemente de que tenham trazido contribuição relevante para as investigações é, por si só, fato que demonstra a um só tempo o periculum in mora e o fumus boni iuris a justificar a concessão da medida pleiteada.

5) A Lei Anticorrupção é clara ao dispor que numa investigação, apenas a primeira empresa a propor o acordo de leniência seria dele beneficiada.

6) Como a investigação é conduzida pelo Ministério Público Federal e grande parte das informações obtidas estão sob sigilo, deflui logicamente que, no âmbito da operação Lava Jato ou de outra que esteja sob a condução do MPF, só haverá lugar para a celebração de acordos de leniência no âmbito da CGU que corroborem acordos já feitos pelo MPF.

7) É preciso que se evite um início de aplicação da Lei Antocorrupção equivocado, tulmutuado, sem a necessária prudência. É preciso garantir que não haja interferências indesejadas, inusitadas e descabidas tanto na esfera própria do Controle Externo quanto nas atribuições do Poder Judiciário e do Ministério Público.

8) Quem defende que apenas os executivos das empresas sejam punidos e que as empresas não devam ser punidas, faz apologia à impunidade. A legislação brasileira prevê expressamente punições às empresas envolvidas em ilícitos cometidos em seu beneficio.

9) Acordo de leniência não salva empregos, nem é feito para isso. Eventual pena de inidoneidade, uma das mais severas do ordenamento jurídico, prevista na Lei de Licitações e na Lei Orgância do TCU, não impede a continuidade dos contratos em curso. Vale dizer, todas as obras contratadas podem continuar, expurgados, evidentemente, os superfaturamentos identificados.

10) Quem gera empregos são as obras, não as empreiteiras. Há centenas de empresas brasileiras, que hoje já são subcontratadas das grandes empreiteiras, que podem e desejam obter contratos de obras públicas no Brasil sem ter de participar de cartéis de propina ou esquemas de corrupção. Igualmente, há dezenas de empresas estrangeiras que podem contribuir com o desenvolvimento nacional sob padrões de conduta eticamente corretos.

Fonte: Folha de S. Paulo