MPC-ES tem prejulgado acatado para definir critérios de divisão de honorários em ações com vitória da Fazenda Pública
Publicação em 5 de agosto de 2024

Decisão do Tribunal de Contas defende a relevância do tema e a necessidade de um posicionamento com aplicabilidade de forma geral; instauração de prejulgado foi defendida pelo Ministério Público de Contas em processo que trata de denúncia noticiando supostas irregularidades quanto ao pagamento de honorários sucumbenciais no valor de mais de R$ 4 milhões à Associação dos Procuradores do Município de Anchieta

A proposta do Ministério Público de Contas do Espírito Santo (MPC-ES) para instaurar prejulgado com o objetivo de definir critérios para a divisão de honorários advocatícios em ações em que a Fazenda Pública for vencedora foi acatada pela Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES), em sessão virtual realizada no último dia 26.

Com a decisão, será aberto um novo processo em que a Corte de Contas deverá se pronunciar sobre como funcionará essa divisão dos chamados honorários advocatícios sucumbenciais das causas em que a Fazenda Pública for vencedora e o posicionamento passará a valer como norma para todos os casos submetidos à apreciação do TCE-ES.

Os principais pontos listados pelo MPC-ES para que o Tribunal se pronuncie são: forma de recolhimento, contabilização e gestão desses recursos, submissão ao teto constitucional remuneratório e base de cálculo para incidência do imposto de renda, permitindo os controles administrativo, externo e social.

Parecer ministerial

O pedido de instauração do prejulgado foi apresentado pelo Ministério Público de Contas em parecer emitido no Processo 784/2020, o qual trata de denúncia formulada por cidadão noticiando supostas irregularidades quanto ao pagamento de honorários sucumbenciais no valor de mais de R$ 4 milhões à Associação dos Procuradores do Município de Anchieta, em transação tributária firmada entre o município e a Samarco Mineração S.A. No parecer, também foi proposto aditamento à denúncia, o que levou a nova análise dos fatos pela área técnica do TCE-ES.

Entre as justificativas do MPC-ES para que a Corte de Contas instaure o prejulgado estão a situação ocorrida em Anchieta, que resultou no pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais milionários que não foram submetidos a qualquer forma de controle administrativo – ou judicial – em relação à observância do teto remuneratório constitucional aplicável aos advogados públicos, e o fato de a ausência de controle administrativo sobre a inclusão dos honorários de sucumbência no teto remuneratório constitucional aplicável aos advogados públicos não se restringir a Anchieta, mas ocorrer também em vários outros entes públicos no Espírito Santo.

O órgão ministerial também destacou que o recebimento de honorários sucumbenciais por meio da intermediação de associações profissionais, realizado à margem do controle administrativo, pode ensejar não apenas a percepção de verbas remuneratórias acima do teto constitucional, além da eventual omissão de sua declaração à Receita Federal, mas também proporcionar a destinação indevida de valores a pessoas estranhas ao quadro de advogados públicos, hipóteses que caracterizariam desvio de finalidade da associação.

Outro ponto mencionado pelo MPC-ES foi a inexistência de norma que discipline o pagamento da parte dos honorários sucumbenciais que, no mês de sua disponibilização financeira pelo Juízo ou pela parte adversa, exceda o teto remuneratório constitucional aplicável aos advogados públicos.

 

Denúncia sobre honorários pagos em Anchieta

Conforme apurado nos autos, a Transação Tributária celebrada entre o município de Anchieta e a Samarco Mineração S.A., firmada em 20/6/2019 e homologada por sentença em 04/07/2019, previu em sua cláusula quarta o pagamento de 50% do valor total consolidado até 30/07/2019 e o saldo remanescente até 30/07/2020.

Ao examinar a decisão judicial que autorizou as transferências dos honorários advocatícios diretamente para a conta da Associação dos Procuradores Municipais de Anchieta, o MPC-ES expôs que tal fato possibilitaria, em tese, a interpretação de que outros agentes que não fossem advogados públicos também pudessem receber os honorários de sucumbência, “na medida em que não houve qualquer controle sobre a destinação dos recursos, livremente manejado pela entidade associativa”.

Além disso, acrescentou que a decisão judicial possibilitou que os recursos deixassem de passar pelo controle do teto remuneratório e dos critérios de distribuição que deveriam ser realizados previamente pela administração pública, conforme disciplinado pelos art. 4º e 7º do Decreto Municipal 5.242/2015, os quais preveem a necessidade de que os honorários advocatícios transitem, de forma extraorçamentária, pelas contas do município, possibilitando, assim, o controle previsto no art. 37, XI, da Constituição Federal e pela legislação municipal.

Na manifestação da área técnica do TCE-ES consta que, embora não se possa afirmar categoricamente o descumprimento do teto remuneratório previsto na Constituição, nem que outros agentes além dos previstos na legislação municipal receberam honorários, “é possível identificar indícios de que não houve qualquer controle administrativo ou judicial sobre a destinação dos recursos, livremente manejado pela entidade associativa, quando deveriam ser contabilizados no município como receita extraorçamentária, nos termos da lei”.

Decisão

Com base na manifestação técnica, acolhida no voto do conselheiro Carlos Ranna, relator do caso, a Primeira Câmara do TCE-ES decidiu instaurar o prejulgado, nos termos propostos pelo Ministério Público de Contas, para que a Corte de Contas reconheça a relevância do assunto e sua aplicabilidade de forma geral e se pronuncie sobre os honorários advocatícios sucumbenciais nas causas em que a Fazenda Pública for vencedora.

A decisão, publicada no Diário Oficial de Contas desta sexta-feira (2), ainda determina a notificação da Associação dos Procuradores Municipais de Anchieta para que apresente, no prazo regimental, a relação de beneficiados, valores desembolsados e datas de pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais recebidos pela associação decorrentes do Termo de Transação Tributária firmado entre o município de Anchieta e a Samarco nos autos do processo 0002151-21.2006.8.08.0004, no valor total de R$ 4.255.679,48, acompanhados de documentos comprobatórios, sob pena de multa diária.

Também foi determinado o compartilhamento das informações relacionadas ao pagamento desses honorários com a Receita Federal, em razão da possibilidade de não terem sido declarados como remuneração, deixando de ser incluídos na base de cálculo do imposto de renda.

Veja na íntegra a Decisão no Processo 784/2020

Confira o andamento do Processo 784/2020