Dimmi Amora, de Brasília
O plenário do TCU (Tribunal de Contas da União) aprovou, por unanimidade, relatório que considera as manobras fiscais realizadas pelo Tesouro com dinheiro de bancos públicos federais como crime de responsabilidade.
Dezessete autoridades do governo terão que apresentar, em 30 dias improrrogáveis, explicações ao tribunal para as irregularidades apontadas no relatório.
Como a Folha antecipou em agosto do ano passado, o Tesouro segurou repasses destinados a pagar benefícios sociais, o que levantou questionamentos do BC, já que a manobra pode configurar empréstimo dos bancos ao governo algo proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
As chamadas pedaladas fiscais reduziram artificialmente o déficit do governo. “Deixar de inserir no orçamento as autorizações de gasto de natureza orçamentária e as respectivas fontes de financiamento (…) é atitude que se mostra incompatível com o ordenamento jurídico vigente”, escreve o relator do processo, ministro José Múcio, que completou “tais procedimentos violam restrições e limitações impostas pela LRF”.
O aprovação desse relatório dá força aos partidos de oposição ao governo Dilma, que querem usar as pedaladas como argumento para abrir um processo de impeachment sobre a presidente.
Para o TCU, o governo deixou de repassar ao menos R$ 40 bilhões de verbas ao BB, Caixa e BNDES para pagamentos de seguro-desemprego, Minha Casa, Minha Vida, Bolsa Família, crédito agrícola, PSI (Programa de Sustentação de Investimentos), os bancos tiveram que pagar os compromissos com recursos próprios, o que constitui um empréstimo. O ministro Vital do Rego, classificou a operação como uma espécie de uso do “cheque especial” sem permissão.
O crime de responsabilidade pode resultar em perda do cargo por até cinco anos e pagamento de multa. Além disso, os responsáveis podem ter que responder por ato de improbidade, que prevê a devolução dos recursos que tenham sido desviados.
Como é vedado ao TCU analisar crimes, o órgão repassou os dados para o Ministério Público Federal. A AGU (Advocacia-Geral da União) defende a tese de que não houve empréstimos.
Entre as 14 autoridades que terão que se explicar estão o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, o ex-secretário do Tesouro Arno Augustin, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, e o ex-secretário de Política Econômica da Fazenda, Nelson Barbosa (atualmente no comando do Ministério do Planejamento), o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, o ex-presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendini (atualmente presidente da Petrobras), entre outros.
Em entrevista após a aprovação do acórdão, o relator do processo afirmou que a investigação ainda está no início e que os atos apurados não são de corrupção e sim um problema de gestão do governo. Segundo ele, todos os “protagonistas da cena” foram chamados para se explicar.
“Para que possamos, com absoluta exatidão, sem condenar ninguém a priori, [saber] de onde partiu, quem são os atores principais. Vamos seguir o dinheiro, de onde partiu a ordem, a decisão de que isso fosse feito”, afirmou Monteiro.
O ministro disse ainda que não há dúvida que o empréstimo está caracterizado e que isso descumpre “sem dúvida” a lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo ele, com as manobras, as contas públicas foram embelezadas e agora o Banco Central terá que refazer os cálculos com o intuito de saber se as metas fiscais estabelecidas foram cumpridas e qual o tamanho da dívida do governo real a partir de 2013.
O TCU também vai analisar as pedaladas no processo de aprovação das contas do governo.
O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse que as medidas tratadas no relatório do Tribunal de Contas da União foram adotadas “com total amparo da LRF [Lei de Responsabilidade Fiscal]” e contam com parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
“Vamos responder na forma que a Advocacia Geral da União nos orientar”, afirmou.
O procurador do Banco Central presente ao julgamento, Isaac Ferreira, afirmou que o órgão não é responsável de execução da política fiscal, não ordena despesa e nem arrecada receita orçamentária. Segundo ele, cabe ao banco, para fins exclusivos de avaliação econômica, apenas elaborar estatísticas fiscais.
Perguntado se a presidente Dilma seria investigada, Múcio disse que nem o Ministério Público nem os técnicos do TCU apontaram essa possibilidade. Para ele, não houve má-fé dos gestores.
“Faltou dinheiro para pagar as contas. As pessoas tiveram que cumprir uma ordem”, disse Múcio.
Fonte: Folha de S.Paulo