Ministério Público de Contas aponta irregularidades em contrato do Detran-ES e pede suspensão de pagamentos
Publicação em 12 de maio de 2015
Sede do Detran-ES

Sede do Detran-ES

O Ministério Público de Contas (MPC) deu entrada em representação, na última terça-feira (5), em face de irregularidades verificadas em contrato firmado em 2014, sem licitação, pelo Departamento Estadual de Trânsito do Espírito Santo (Detran-ES) com a empresa Futura Consultoria e Pesquisa Ltda., no valor de R$ 3.254.138,33, relativo à fase III do projeto “Educação para o Trânsito”. No documento, o MPC pede a concessão de medida cautelar ao Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES) para determinar ao Detran que se abstenha de efetuar qualquer pagamento à empresa contratada até decisão final no processo, sob pena de pagar multa.

Na representação, proposta em face de Carlos Augusto Lopes, ex-diretor-geral do Detran-ES, Anderson Ricardo Azevedo, ex-coordenador da Coordenação de Produção Pedagógica (Coped), Tarcílio Deorce da Rocha, ex-diretor-técnico, e Gualberto, Orrico & Caliman Ltda. (empresa Futura Consultoria e Pesquisa Ltda.), o órgão ministerial narra os fatos que resultaram em sucessivas contratações por inexigibilidade de licitação.

Elas foram iniciadas em 2007, com a concepção do projeto “Igualdade no Trânsito”, coordenado pelo antropólogo Roberto DaMatta, com a realização de uma série de levantamentos qualitativos sobre o trânsito no Estado do Espírito Santo.

A contratação direta se deu com justificativa de notória especialização do antropólogo Roberto DaMatta (profissional especializado no segmento de educação de trânsito), representado, com exclusividade, pela empresa Futura, na realização de consultoria para o projeto “Educação no Trânsito” do Detran-ES. O MPC questiona a contratação da Futura sem licitação, pois o objeto do contrato é múltiplo e, além disso, o antropólogo possui empresa própria de consultoria. DaMatta atuaria na coordenação geral do projeto.

Antes do contrato firmado em 2014 com a Futura, o projeto teve duas etapas. Na fase I, o antropólogo ministrou palestra, em 2008, e, posteriormente, lançou um livro relacionado ao tema de educação no trânsito. Em 2010, o Detran-ES iniciou a fase II do projeto, que consistiu na realização de pesquisas qualitativas e workshops, com a elaboração de um projeto pedagógico de execução do conteúdo do trânsito nas escolas, e a qual teve parceria da Secretaria de Estado da Educação (Sedu).

Na avaliação do MPC, o Detran-ES vinculou o seu contrato à vontade da contratada, manifestada por meio da proposta apresentada (projeto “Educação no Trânsito”) pela empresa Futura, havendo inversão de papéis. Verificou-se, também, fragilidade no planejamento das ações por parte do Detran-ES, que, com base nas conclusões dos estudos desenvolvidos na fase I do projeto, teria subsídios suficientes para elaboração do plano de trabalho e do projeto básico, documentos essenciais para instrução do procedimento de contratação, inclusive de forma direta.

“Trânsito para o Outro”
A fase II foi encerrada no final de 2010 e, em outubro de 2013, o Detran-ES iniciou novo procedimento, tendo em vista a apresentação de nova proposta elaborada pela empresa Futura, demonstrando interesse em executar a fase III do projeto “Educação para o Trânsito”, agora denominado “Trânsito para o Outro”. O procedimento foi concluído com a assinatura do contrato 033/2014, no valor R$ 3.254.138,33, mediante dispensa de licitação.

A terceira fase do projeto, em síntese, compreende a apresentação ao público escolar do projeto “Trânsito para o Outro” pelo professor Roberto DaMatta, em eventos realizados nos municípios de Vitória, Colatina, Cachoeiro de Itapemirim e São Mateus; criação de roteiros de aulas com seus respectivos conteúdos pedagógicos para alunos do 1º e do 2º ano do ensino médio; desenvolvimento de uma plataforma digital; realização de grupos focais e formação de professores.

O MPC observou que, ao elaborar o projeto original “Educação para o Trânsito”, a Futura incluiu como etapa 3 a produção de kit sobre comportamento no trânsito. A fase foi alterada para o desenvolvimento de uma plataforma digital, sem qualquer motivação por parte do Detran-ES.

Outros indícios de irregularidades apontados foram: especificação do objeto do contrato de forma incompleta, evidenciando-se, assim, a falta de cuidado e planejamento; e atuação da empresa contratada em ramo de atividade incompatível com a totalidade do objeto do contrato.

Sobre o último ponto, a representação narra que grande parte dos 75% do valor do contrato, ou seja, R$ 2.115.189,50, se refere a serviços na área de informática, com disponibilização de plataforma digital e desenvolvimento de software, área em que a Futura não possui “expertise”, tendo em vista que previa que a plataforma digital seria desenvolvida por equipe técnica especializada a ser contratada pela empresa.

Além disso, a legislação prevê que compete ao Instituto de Tecnologia da Informação e Comunicação do Espírito Santo (Prodest) a análise técnica e de viabilidade de contratação de serviços de informática de qualquer natureza. Contudo, o processo não passou pelo crivo do Instituto.

O MPC ressalta, ainda, que não é possível identificar qualquer intervenção do antropólogo DaMatta como coordenador-geral do projeto, inexistindo comprovação de orientação, supervisão ou planejamento dos trabalhos realizados pela empresa Futura. Acrescenta-se a isso o fato de o Detran-ES ter feito o pagamento da totalidade do serviço de conclusão da plataforma digital, no valor de R$ 1.138.948,00, sem que haja comprovação de que o protótipo da plataforma digital tenha sido concluído.

Pedidos
Além da suspensão dos pagamentos do Detran à empresa contratada, por meio da concessão de medida cautelar pelo TCE-ES, o MPC pede a notificação dos representados e que, ao final do processo, seja aplicada a pena de multa e inabilitação de cargo em comissão ou função de confiança aos agentes públicos responsáveis, bem como seja a empresa Futura Consultoria e Pesquisa Ltda. declarada inidônea para participar de licitação ou contratar com o Poder Público estadual e municipal.

A representação tramita no Tribunal de Contas sob o número TC 5489/2015 e tem como relator o conselheiro Sérgio Manoel Nader Borges.

Confira a Representação TC 5489/2015