Determinada suspensão da compra de livros paradidáticos no valor de R$ 1,3 milhão em Barra de São Francisco
Publicação em 23 de novembro de 2016

Decisão do Tribunal de Contas atende ao pedido do Ministério Público de Contas, que apontou indícios de irregularidades na compra sem licitação de aproximadamente 97 mil livros paradidáticos pela Prefeitura de Barra de São Francisco

O Ministério Público de Contas (MPC) obteve decisão favorável no Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES) ao pedido de suspensão imediata dos procedimentos licitatórios 002/2016 e 003/2016 do município de Barra de São Francisco, visando à aquisição de livros paradidáticos no valor total de R$ 1.394.840,00. A suspensão foi determinada por decisão monocrática do conselheiro José Antonio Pimentel, relator da representação TC 9925/2016 do MPC, e deverá ser ratificada pela 2ª Câmara do Tribunal de Contas na próxima sessão.

A decisão prevê também a notificação do prefeito de Barra de São Francisco, Luciano Henrique Sordine Pereira, e da presidente da Comissão de Licitação do município, Joana D´Arc Alves Vilela, para que se pronunciem sobre as irregularidades apontadas na representação pelo MPC no prazo de 10 dias. Em cinco dias, a partir da ciência da decisão, eles deverão publicar no Diário Oficial a suspensão dos procedimentos licitatórios.

Compra direta
A representação do MPC narra que a Prefeitura de Barra de São Francisco publicou no Diário Oficial do Estado, no dia 9 de novembro, atos de inexigibilidade de instauração dos procedimentos licitatórios 002/2016 e 003/2016 para aquisição de livros paradidáticos, respectivamente, no valor de R$ 1.337.440,00 e R$ 57.400,00, totalizando R$ 1.394.840,00, por meio de compra direta à Editora Cidadania Ltda. e à empresa CMF-Comércio e Artigos Educacional Ltda-ME, ambas com sede em Vila Velha.

O objetivo da compra dos livros, segundo os atos da prefeitura, é atender aos projetos elaborados pelas equipes multidisciplinares da Secretaria de Assistência Social, juntamente com o setor pedagógico da Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Nos atos, o município sustenta a inexigibilidade de licitação na exclusividade das empresas contratadas para a aquisição dos livros pretendidos.

No entanto, ao analisar os atos publicados pela prefeitura verifica-se que não há finalidade pública da despesa. Conforme o órgão ministerial, a compra não preencheu todos os requisitos imprescindíveis para a contratação sem licitação nesses casos: a exclusividade de editoração do livro, a justificativa do preço contratado e a justificativa quanto à escolha do objeto contratado. O MPC destaca que a Lei de Licitações (Lei 8.666/93) não desobriga a administração de “definir as quantidades a serem adquiridas em função do consumo e utilização prováveis, cuja estimativa será obtida, sempre que possível, mediante adequadas técnicas quantitativas de estimação”.

21 livros por aluno
Para o Ministério Público de Contas, não há justificativa para aquisição do quantitativo contratado pela prefeitura, pois contraria a Lei de Licitações e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Ele sustenta que não há demanda no município de Barra de São Francisco que fundamente esse gasto vultoso com livros paradidáticos, pois o município tem em torno de 45 mil habitantes e, de acordo com o censo educacional de 2015, foram realizadas 5.052 matrículas na rede municipal de ensino. A prefeitura pretende adquirir aproximadamente 97 mil livros, divididos entre os 21 títulos seguintes:

1. O verdadeiro valor da amizade;
2. O verdadeiro valor da gratidão;
3. O verdadeiro valor da obediência;
4. O verdadeiro valor do respeito;
5. O verdadeiro valor da responsabilidade;
6. Pedofilia: é preciso combater este mal;
7. Crack: o caminho da vida não passa por esta pedra;
8. Álcool e drogas;
9. Violência nas escolas – bullying: este comportamento não pode existir entre nós;
10. Combate à dengue: você também pode colaborar;
11. Água: é preciso economizar para não faltar;
12. Se ligue na internet; aproveite o mundo virtual com responsabilidade;
13. Alimentação saudável – uma decisão familiar;
14. Esporte: importante para a vida de todos;
15. Higiene e saúde bucal: atitudes saudáveis para uma vida melhor;
16. Mata Atlântica: importante conhecer, importante preservar;
17. Cuidando da minha escola. A participação de todos na construção de uma escola melhor;
18. Lixo, lixo e mais lixo: o que fazer?;
19. Programa Câmara na escola. A importância do Poder Legislativo;
20. A turma do Frederico em alimentação saudável;
21. A turma do Frederico em amigos da natureza.

“Serão aproximadamente 5 mil livros de cada um dos 21 títulos, divididos por aproximadamente 5 mil alunos, o que significa que, em somente um ano letivo, além dos livros didáticos, serão 21 tipos de livros paradidáticos para cada aluno da rede municipal, não importando se já foram alfabetizados ou qual ano do ensino estarão cursando”, destaca trecho da representação do MPC.

O órgão ministerial acrescenta não haver justificativa para que os mesmos livros sejam utilizados por todos os alunos da rede municipal de ensino, sem se considerar o ano de ensino que estejam cursando. Cita ainda, a repetição do mesmo assunto em alguns dos livros escolhidos, como nos casos de Alimentação saudável – uma decisão familiar e A turma do Frederico em alimentação saudável, e dos livros Mata Atlântica: importante conhecer, importante preservar e A turma do Frederico em amigos da natureza.

O MPC também questiona a realização de uma despesa pública de aproximadamente 1,5 milhão de reais a 50 dias do final do mandato do prefeito, uma vez que é vedada ao prefeito eleito a interrupção de políticas públicas em fase de implementação, devido ao princípio da continuidade. O atual prefeito, Luciano Henrique Sordine Pereira, disputou a eleição em 2016, mas não foi reeleito.

De acordo com a representação, em oportunidade anterior o município de Barra de São Francisco deixou de utilizar o material didático que é fornecido gratuitamente pelo Ministério da Educação para adquirir material da Editora Positivo Ltda. Porém, em seguida, deixou de usar esse material em razão de dívida no montante de R$ 1.526.887,8 com essa editora, o que a motivou a suspender o fornecimento do material e ajuizar ação judicial de cobrança contra a prefeitura. “Se o município não tem como pagar R$ 1.526.887,85 de material didático, não há fundamento para que contraia nova dívida de R$ 1.394.840,00, agora para livros paradidáticos”, conclui o MPC.

Com base nos argumentos apontados pelo Ministério Público de Contas e para evitar dano à administração pública, o relator deferiu o pedido cautelar e determinou que os procedimentos para compra dos livros sejam imediatamente suspensos na fase em que se encontrarem.

Veja a íntegra da Representação TC 9925/2016