MPC aponta fraude à licitação e formação de cartel entre empresas que atuaram na coleta de lixo de Vitória
Publicação em 1 de fevereiro de 2017

Caminhão de Coleta de Lixo DomiciliarO Ministério Público de Contas (MPC) protocolou representação, nesta terça-feira (31), na qual aponta a formação de cartel entre empresas que atuaram na coleta de lixo do município de Vitória, no período de 2006 a 2014, e a ocorrência de fraude à concorrência pública 001/2006 visando à execução dos serviços de coleta de lixo da Capital, bem como aos contratos dela derivados, os quais se estenderam até 2014. A representação pede a condenação dos responsáveis a ressarcir os cofres públicos e a realização de auditoria ordinária no município de Vitória no contrato de coleta de lixo atualmente em vigor.

A representação foi proposta em face das empresas Queiroz Galvão, Vital Engenharia Ambiental, Corpus Saneamento e Obras, Marca Construtora e Serviços e Construtora Silva Lima, do ex-prefeito de Vitória João Coser, dos ex-secretários municipais de Serviços Urbanos de Vitória Antônio Caetano Gomes, Romário de Castro e Alex Mariano, do controlador-geral do município, Luis Fernando Alves, de membros da Comissão Permanente de Licitação (CPL) e de fiscais dos contratos derivados da concorrência pública 001/2006.

A partir de inquérito instaurado pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), o MPC tomou conhecimento dos indícios de práticas de ato de gestão ilegal, ilegítimo e antieconômico, das quais resultou injustificado dano ao erário, envolvendo o procedimento licitatório referente à concorrência 001/2006, conduzida pela Secretaria Municipal de Serviços de Vitória. A concorrência resultou no contrato 08/2006, firmado com a Queiroz Galvão em junho de 2006, e nos contratos emergenciais firmados nos exercícios de 2012, 2013 e 2014.

Vencedora da concorrência pública e contratada pela Prefeitura de Vitória pelo valor de R$ 219.849.451,20 e pelo prazo total de 60 meses para executar os serviços de limpeza pública do município, a Queiroz Galvão subcontratou a Marca Construtora e Serviços apenas 17 dias após assinar contrato com o município. Ela transferiu para a subcontratada a execução dos serviços de operação de aterro sanitário dos resíduos domiciliares, especiais e de serviços de saúde.

Seis meses após assinar o contrato com a prefeitura, a Queiroz Galvão firmou um contrato cedendo à empresa Vital Engenharia Ambiental todos os serviços contratados, com validade a partir de 1º de janeiro de 2007. Exatamente no dia de início da vigência do contrato de cessão, a Vital Engenharia Ambiental firmou um contrato com a Corpus Saneamento e Obras – habilitada, mas derrotada na concorrência pública -, subcontratando-a para executar parte dos serviços cedidos pela Queiroz Galvão.

A representação narra que, em 13 de março de 2007, o município firmou o primeiro aditivo do contrato para reajuste econômico e financeiro diretamente com a Vital Engenharia. Embora a empresa tivesse assumido a cessão feita pela Queiroz Galvão somente em janeiro de 2007, o aditivo firmado pela prefeitura tinha previsão de vigência contada a partir de 1º de outubro de 2006, ou seja, três meses antes de a empresa Vital Engenharia assumir o contrato.

Em junho de 2011, um aditivo firmado pela Vital Engenharia com a prefeitura previa a prorrogação do contrato por 12 meses, no valor total de R$ 381.325.296,44. Seguiram-se a esse aditivo, as contratações emergenciais realizadas entre julho de 2012 e dezembro de 2014, todas elas efetivadas sem prévia comprovação da compatibilidade dos preços praticados com os do mercado, mediante pesquisa de preços. Em razão disso, o MPC considera que os contratos firmados nesse período são mero prolongamento do contrato 08/2006, o qual teve seus efeitos estendidos até 4 de dezembro de 2014, quando uma nova concorrência pública foi realizada. Esses dados afastam também qualquer alegação de prescrição de eventual punição em relação aos indícios de irregularidades do edital, no entendimento do órgão ministerial.

Irregularidades
A representação aponta como indícios de irregularidades: a cessão do contrato pela Queiroz Galvão à Vital Engenharia Ambiental, empresa que entrou em atividade apenas em 20 de novembro de 2006 e em 2007 assumiu contratos firmados pela Diretoria de Meio Ambiente da Queiroz Galvão; a subcontratação da Marca Construtora e Serviços pela Queiroz Galvão e da Corpus Saneamento e Obras pela Vital Engenharia para executar 28% do contrato; a deficiência do projeto básico e a ausência de critério para elaboração do orçamento detalhado, resultando em sobrepreço; a ilegalidade da visita técnica obrigatória; a ilegalidade das contratações emergenciais; e fraude à licitação, com formação de cartel entre as empresas envolvidas.

Para o MPC, os indícios levantados até o momento demonstram a existência de burla ao procedimento licitatório com o intuito de beneficiar a contratação das empresas Vital Engenharia e Corpus Saneamento e Obras. Da mesma forma, os documentos analisados revelam fortes indícios de ajuste prévio entre as empresas, por intermédio do qual, na divisão dos valores, uma licitante apresenta proposta vencedora e, posteriormente, subcontrata licitante desclassificada, evidenciando absoluta ausência de competitividade, inexistindo disputa licitatória, mas sim atividade de subcontratação do objeto, reunindo duas ou mais empresas.

“Nessa linha, há indícios de que a empresa vencedora da licitação (Queiroz Galvão) fez um consorciamento pré-estabelecido ou acordo para subcontratação dos serviços, dividindo-se o escopo com a licitante desclassificada (Corpus Saneamento e Obras)”, acrescenta a representação ministerial.

O MPC conclui que, diante de todas as manobras realizadas ao longo do contrato, com cessão e subcontratações, o serviço de coleta de lixo no município de Vitória foi prestado sem ter sido submetido à licitação por mais de oito anos.

Dano ao erário
Além de burlar a licitação, por meio da formação de cartel entre as empresas concorrentes, o MPC aponta que houve dano ao erário em três situações decorrentes do procedimento licitatório visando à contratação de empresa para execução do serviço de coleta de lixo em Vitória, em 2006. A primeira delas quando o município firmou um aditivo com a Vital Engenharia, em março de 2007 com data retroativa a outubro de 2006, pois é possível que o município tenha pagado pelos mesmos serviços duas vezes – uma à Queiroz Galvão e outra à Vital Engenharia – e o valor do dano deverá ser quantificado pela área técnica do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES).

A segunda situação diz respeito à fixação dos preços unitários que são objeto do edital 001/2006 e à ausência de elaboração de projeto básico. Contratada para elaborar um orçamento detalhado, com cotação de preços unitários para a licitação, a empresa Construtora Silva Lima tão somente fez o cálculo “com base no valor pago hora/homem e hora/máquina” e no custo administrativo da empresa Queiroz Galvão para prestar aqueles serviços. Para o MPC, o trabalho entregue pela Construtora Silva Lima não corresponde ao contratado e também não foi verificada comprovação da prestação dos serviços, razão pela qual pede a restituição ao erário da quantia recebida pela empresa, o total de R$ 13 mil.

A terceira situação decorre da ausência de projeto básico devidamente detalhado, o que gerou sobrepreço na contratação, razão pela qual o MPC defende que os responsáveis sejam condenados a ressarcir os valores pagos a título de sobrepreço.

Além da condenação dos responsáveis a ressarcir os cofres do município de Vitória, o órgão ministerial pede que lhes seja aplicada multa, a pena de inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança, a declaração de inidoneidade do licitante fraudador para participar de licitação ou contratar com a administração pública estadual e municipal, e proibição de contratação, pelo Poder Público estadual ou municipal, do agente público responsabilizado pela prática de grave infração e do terceiro que, como contratante ou parte interessada na prática do mesmo ato, haja concorrido para a ocorrência do dano ao erário.

Também está entre os pedidos do MPC a realização de auditoria ordinária no município de Vitória no contrato em vigor para limpeza pública e coleta de lixo, buscando-se aferir se o quantitativo contratado refere-se à demanda real e se os preços são compatíveis com os de mercado.

Por fim, o órgão determina o envio de cópias da representação e dos documentos que a instruem, bem como dos procedimentos em trâmite ou encerrados no Tribunal de Contas que envolvam as mesmas empresas representadas para a contratação de serviços de limpeza pública, ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e ao Ministério Público Federal (MPF), considerando indícios de descumprimento do acordo de leniência firmado pela empresa Queiroz Galvão, da qual a Vital Engenharia é subsidiária integral, no âmbito da operação Lava Jato, em razão das mesmas práticas de irregularidades apuradas no caso.

Leia na íntegra a Representação TC 1092/2017