TCU e Ministério Público pedem veto a projeto que altera controle de agentes públicos
Publicação em 20 de abril de 2018

Segundo procuradores, proposta gera o risco de converter os órgãos de controle e da Justiça em órgãos de consultoria da própria administração

Ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) e entidades representativas de procuradores pediram ao presidente Michel Temer o veto de um projeto que altera as regras usadas por órgãos de controle e pela Justiça para punir agentes públicos.

Quatro ministros do Tribunal de Contas da União estiveram com o presidente Temer para pedir o veto de artigos do texto. A Procuradoria-Geral da República (PGR) quer o veto integral do projeto que, avalia, leva à impunidade.

A PGR afirma que se o projeto for sancionado dificilmente haverá prevenção, repressão e ressarcimento aos cofres públicos de danos por atos de improbidade administrativa.

A proposta foi apresentada em 2015 pelo senador Antonio Anastasia, do PSDB. Aprovado no Senado e na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, sem passar pelo plenário, o projeto seguiu direto para o Palácio do Planalto, onde espera sanção.

A procuradoria diz que o projeto usa expressões abertas, cheias de lacunas, que podem levar os processos de responsabilização de administradores públicos por caminhos imprevisíveis, e cita os pontos da proposta que dificultariam o combate à corrupção.

Entre eles, está o artigo 20, que diz que “não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão”.

De acordo com juristas ouvidos pelo Jornal Nacional, o texto torna obrigatório a órgãos de fiscalização e da Justiça fazer um levantamento sobre os impactos econômicos, sociais e administrativos antes, por exemplo, de pedir a revisão de um contrato.

A PGR afirma que “o artigo proposto peca por transferir indevidamente ao julgador os ônus e as responsabilidades inerentes à atividade do gestor público”. A proposta, de acordo com procuradores, gera o risco de converter os órgãos de controle e da Justiça em órgãos de consultoria da própria administração.

O artigo 25 diz que “por razões de segurança jurídica de interesse geral, o ente poderá propor ação declaratória de validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa”.

De acordo com o Tribunal de Contas da União, esse artigo permite que os envolvidos na negociação com o governo consigam na Justiça uma certidão para validar um contrato, processo ou norma administrativa, evitando assim investigações ou mesmo contestações administrativas.

O procurador do Ministério Público de Contas no Tribunal de Contas da União Júlio Marcelo de Oliveira afirma que o artigo 28 do projeto de lei estimula a impunidade. O artigo diz que o agente público só pode ser responsabilizado por alguma ação em que haja erro grosseiro ou dolo. Mas que “não se considera erro grosseiro, a decisão baseada em interpretação razoável de jurisprudência ou doutrina mesmo que ela não venha a ser posteriormente aceita por órgãos de controle ou judiciais”.

“Do jeito que está a lei, a ignorância do gestor vai ser usada como escudo: ‘ah, eu não sabia, eu não sei. Então, eu não entendia, eu não sabia que eu estava fazendo uma coisa errada’. Então, isso também dá uma margem de desculpa, de isenção de responsabilidade, que induz o gestor a ser menos cuidadoso”, explica Oliveira, procurador do MPC no TCU.

Um dos juristas que ajudaram a elaborar o projeto rebate as críticas. “Esse projeto ajuda a focar o controle público nas grandes irregularidades praticadas por gente desonesta. Nada, absolutamente, nada, muda nessa lei com relação à punição de crimes ou à desonestidade administrativa. Essa lei protege quem confia na administração pública e é honesto, o gestor público que é honesto, e o controlador público, que quer focar o controle no combate as irregularidades graves, como aquela que a Lava Jato está demonstrando”, diz Carlos Ari Sundfeld, professor da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo.

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto considera o projeto inconstitucional. “Isso é de uma inconstitucionalidade enlouquecida e inverte as coisas, coloca o Judiciário para fazer as vezes desses órgãos de controle e fiscalização e coloca a lei, ainda tem isso, ainda há isso, e a lei indica tantos parâmetros de interpretação do direito que esse projeto de lei termina levando o legislador a fazer as vezes do julgador”, diz Ayres Britto.

A Procuradoria-Geral da República afirma que a proposta enfraquece a Lei de Responsabilidade Fiscal, um dos marcos no controle dos gastos públicos, e pode, inclusive, ter efeitos retroativos, beneficiando quem já foi processado ou punido, já que seria uma lei mais branda do que a atual.

Fonte: G1 (com adaptações)