Empresa denuncia possível crime de formação de cartel entre proprietários de supermercados de Aracruz
Publicação em 1 de março de 2023

Apesar de reconhecer a incompetência do Tribunal de Contas para apurar eventuais crimes, o MPC, baseado no dever de representação da Corte de Contas, sugere o encaminhamento de cópia do processo à Promotoria de Justiça de Aracruz

 

O Ministério Público de Contas (MPC), ao analisar o Processo TCE/ES 6155/2022 – que trata de denúncia de formação de cartel, no município de Aracruz, em relação ao serviço de fornecimento e administração de cartão alimentação do tipo eletrônico ou magnético – propõe o envio de cópia dos autos à Promotoria de Justiça de Aracruz para conhecimento e medidas que entender cabíveis.

Embora reconheça a incompetência da Corte de Contas para apreciação da matéria, o MPC constata que os fatos narrados (possíveis crimes contra a ordem econômica e o processo licitatório) devem ser apurados pelo Ministério Público Estadual, motivo pelo qual requer o envio de cópia dos autos à Promotoria de Justiça de Aracruz.

 

ORIGEM DO CONFLITO

A denúncia em comento foi formulada por pessoa jurídica de direito privado, com identidade preservada, em face do Prefeito Municipal de Aracruz, senhor Luiz Carlos Coutinho.

A denunciante venceu o Pregão Eletrônico nº 10/2019 (Processo Administrativo nº 18.782/2018), cujo objeto refere-se à “contratação de empresa especializada para prestação dos serviços de administração e gerenciamento informatizado, com emissão e fornecimento de cartões magnéticos/eletrônicos, com chip, para utilização mediante uso de senha individual, com recargas online mensais de crédito, para concessão do benefício de auxílio-alimentação, em favor dos servidores ativos da Prefeitura Municipal de Aracruz, compreendendo efetivos, comissionados e contratados“, porém não conseguiu cadastrar supermercados de médio e grande porte da região e, com isso, teve os contratos administrativos nº 28, 59 e 60 de 2021 rescindidos unilateralmente pela Prefeitura Municipal de Aracruz.

A falta de credenciamento de supermercados foi, portanto, o motivo da rescisão dos contratos, os quais, juntos, possuem o valor de R$ 20.869.200,00 (vinte milhões oitocentos e sessenta e nove mil e duzentos reais).

A empresa denunciante alega que seu direito de prestar o serviço foi violado em razão da suposta mobilização de concorrentes – principalmente da diretoria da Associação Capixaba de Supermercados (ACAPS), cujos membros (proprietários dos principais estabelecimentos comerciais, segundo relatado) teriam  recusado sua filiação e impedido sua atividade comercial – para que não conseguisse operacionalizar a expansão de sua rede de credenciados no Município de Aracruz.

De acordo com os contratos administrativos nº 28, 59 e 60 de 2021, a empresa contratada deveria comprovar possuir rede credenciada, em número mínimo de estabelecimentos, após a assinatura do acordo. Ocorre que nenhum supermercado de grande porte foi cadastrado.

 

O CONSELHEIRO RELATOR CONCORDOU COM A PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO DO MPC?

De posse dos autos, o Conselheiro Relator, em seu Voto (Voto do Relator 00947/2023-1), não concordou com a proposta do MPC de envio de cópia dos autos à Promotoria de Justiça de Aracruz para conhecimento e medidas que entender cabíveis.

Conforme exposto no Voto, se o MPC desejar, que ele faça o encaminhamento sugerido.

 

 

“Deixo de encaminhar cópia dos presentes autos à Promotoria de Justiça de Aracruz conforme sugerido pelo Eminente Procurador, pois sua Excelência pode fazê-lo se assim desejar.”, expôs o Relator.

 

 

QUAL O FUNDAMENTO DO PEDIDO FORMULADO PELO MPC?

O MPC baseou seu pedido no DEVER DE REPRESENTAÇÃO do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE/ES), detalhado no artigo 71, XII, da Constituição Estadual e no artigo 1º, XX, do Regimento Interno do TCE/ES, abaixo transcritos:

 

Art. 71 O controle externo, a cargo da Assembleia Legislativa ou da Câmara Municipal, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas do Estado ao qual compete:

XII – representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos apurados.

Art. 1º Ao Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, órgão de controle externo do Estado e dos Municípios, nos termos da Constituição Federal e da Constituição Estadual e na forma estabelecida na sua Lei Orgânica, compete:

XX – representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos apurados, indicando o ato inquinado e definindo responsabilidades;

 

Segundo essas normas, quando a matéria escapar de suas competências, o TCE/ES deverá comunicar ao Poder competente a irregularidade denunciada, com o objetivo de que sejam adotadas as providências necessárias. Trata-se de uma obrigação, não de uma faculdade.

Na hipótese de eventual cometimento de crime, por exemplo, cabe à Corte de Contas representar ao Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MP/ES) para que tome as medidas de sua alçada.

 

E AGORA, QUAL O DESTINO DO PROCESSO?

O Processo TCE/ES 6155/2022 está pautado para julgamento na 7ª Sessão Ordinária da 1ª Câmara do TCE/ES, que ocorrerá no dia 10 de março de 2023, momento em que os demais Conselheiros acolherão ou não o Voto do Conselheiro Relator.

 

COMO SE CONFIGURA O CRIME DE FORMAÇÃO DE CARTEL?

Para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o crime de formação de cartel, espécie de crime contra a ordem econômica, configura-se com o abuso do poder econômico com o fim de dominar o mercado ou de eliminar a concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas ou com a formação de acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes para fixar artificialmente preços ou quantidades vendidas ou produzidas, controlar o mercado regional por empresa ou grupo de empresas ou controlar, em detrimento da concorrência, rede de distribuição ou de fornecedores (AgRg no RHC 146.530/RS).