MPC pede suspensão da participação de candidatos não concursados em seleção para cargos de chefia da Sefaz
Publicação em 24 de outubro de 2016

O Ministério Público de Contas (MPC) pede, em representação protocolada na sexta-feira (21) no Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES), a suspensão imediata de trecho do edital 03/2016 da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz) que permite a contratação de candidatos não concursados para preencher vagas de cargos de chefia na área tributária e fiscal da Fazenda Estadual. O MPC enfatiza que somente servidor público investido em cargo efetivo possui legitimidade para praticar os atos previstos nas atribuições dos cargos de Chefe da Agência da Receita Estadual, Subgerente Fiscal, Gerente Tributário e Gerente Fiscal.

O órgão ministerial pede também que o Tribunal de Contas reconheça, no caso concreto, a inconstitucionalidade da Lei Complementar Estadual 832/2016, a qual serviu de base para o edital da Sefaz, e que lhe seja negada a aplicação. A lei revogou dispositivos que indicavam quais cargos em comissão eram privativos de cargo efetivo de Auditor Fiscal da Receita Estadual e estabeleceu que os cargos comissionados da Sefaz são de livre nomeação e exoneração, possibilitando a delegação de atribuições, até então exercidas privativamente por servidores efetivos, a profissional sem vínculo com a administração tributária estadual, em clara ofensa ao princípio constitucional do concurso público.

A representação, proposta em face do secretário estadual da Fazenda, Paulo Roberto Ferreira, aponta irregularidades no edital 03/2016 da Sefaz, relativo ao processo seletivo para o preenchimento de cargos em comissão da Secretaria, o qual possibilita a participação de profissionais com ou sem vínculo com a administração pública. Para o MPC, as regras previstas no edital burlam o princípio do concurso público, violam a exigência constitucional de a administração tributária ser exercida por servidores de carreira específica, configuram ato antieconômico e ferem o instituto da indelegabilidade do poder de polícia, ao permitir que profissional com vínculo precário exerça fiscalização, que constitui atividade típica de estado.

Vagas
O edital foi deflagrado no dia 6 de outubro, com previsão de encerramento e publicação do resultado final no dia 01 de novembro de 2016. Ele prevê o preenchimento de 10 vagas em cargos de chefia da Secretaria de Estado da Fazenda. São eles: Chefe da Agência da Receita Estadual I (Cachoeiro de Itapemirim, Colatina, Cariacica e Linhares); Chefe da Agência da Receita Estadual II (São Mateus); Subgerente Fiscal – Região Metropolitana (Vila Velha); Subgerente Fiscal – Região Nordeste (Linhares); Subgerente Fiscal – Região Sul (Cachoeiro de Itapemirim); Gerente Tributário (Vitória); e Gerente Fiscal (Vitória).

Conforme a representação, a principal irregularidade está contida no item 5.1 do edital da Sefaz, que estabelece a ordem de preenchimento das vagas oferecidas. Enquanto as três primeiras cláusulas registram os servidores efetivos que poderão concorrer às vagas, a alínea IV do item 5.1 estabelece que elas poderão ser preenchidas “pelos demais candidatos”, ou seja, “profissionais desprovidos de qualquer vínculo anterior com o setor público, mormente não afetos à Secretaria de Estado da Fazenda”.

Essa irregularidade decorre de dispositivo previsto na Lei Complementar Estadual nº. 832, de 25 de agosto de 2016, que, “em flagrante descompasso com as Constituições Federal e Estadual, passou a permitir o estabelecimento de vínculo precário entre a administração tributária estadual e os eventuais ocupantes dos cargos especificados nos dispositivos revogados, fazendo com que os agentes contratados passassem a desempenhar importantes funções sem a independência necessária”.

O MPC reforça que a cláusula do edital, bem como a lei da qual ela decorre, contrariam a Constituição Federal e a Constituição Estadual, que definem que os servidores das administrações tributárias devem possuir carreiras específicas. As constituições estabelecem, por consequência, dentre outros termos, “que os cargos comissionados no plano da administração tributária não seriam ocupados por pessoas apartadas do setor público, mas sim pelos próprios agentes, ocupantes de cargos efetivos, vinculados à carreira específica, que são preenchidos mediante prévia aprovação em concurso de provas ou de provas e títulos, como forma de garantia de impessoalidade e maior segurança na execução de suas atividades”.

Credibilidade
Com amparo na LC 832/2016, considerada inconstitucional pelo órgão ministerial, o edital da Sefaz possibilita que importantes cargos de chefia, como os de Gerência Tributária e Gerência Fiscal, sejam ocupados por profissional totalmente desvinculado da carreira específica da administração tributária, tornando vulnerável o exercício da função, podendo fragilizar e deslegitimar a atividade tributária, bem como as premissas da administração tributária.

Na avaliação do MPC, a manutenção da credibilidade da atividade fazendária depende, em suma, que os cargos oferecidos pelo edital 03/2016 da Sefaz “sejam ocupados tão somente por pessoal com vínculo com a administração tributária, da carreira de Auditor Fiscal da Receita Estadual, pois somente o profissional formado no interior dessa estrutura, com a garantia da independência funcional, e a estabilidade que o blinda de ingerências políticas, pode exercer com plenitude as magnas competências da unidade administrativa”. Entre as atribuições do profissional da carreira estão o planejamento, a orientação e a avaliação da ação fiscal no Estado, a proposição de adequação e aperfeiçoamento da legislação tributária visando o combate à evasão de receitas e à fraude fiscal, a supervisão e o acompanhamento da fiscalização nos estabelecimentos e no trânsito de mercadorias no âmbito de suas regionais.

Mais irregularidades
A representação considera ato antieconômico possibilitar a nomeação de candidatos sem vínculo com o setor público nos cargos de chefia da Sefaz, pois os contratados poderão ser remunerados com o valor integral do cargo em comissão, ocasionando aumento de despesa com pessoal para o governo do Estado. O MPC ressalta que os servidores efetivos que exercem os cargos em comissão de chefia, tais quais os previstos no edital, optavam pela remuneração do cargo efetivo, acrescendo-se gratificação equivalente a 65% do cargo em comissão.

Outra irregularidade destacada pelo MPC no edital é a possibilidade de profissional sem vínculo com a administração pública exercer o poder de polícia, competência indelegável a particular, ainda mais quando há estrutura de carreira de estado para tal atividade. “A fiscalização é um serviço exclusivo do Estado, pois relacionada ao exame de informações, documentos e procedimentos administrativos. Ao permitir ilegal atuação, provoca-se, de forma inegável, a vulnerabilidade do sistema de arrecadação e fiscalização”, acrescenta o órgão ministerial.

O edital da Sefaz 03/2016 também afronta a regra do concurso público, no entendimento do MPC, pois possibilita que profissionais alheios à administração tributária exerçam cargos com atividades de caráter rotineiro e permanente, análogas às exercidas por Auditor Fiscal da Receita Estadual.

Pedidos
Em razão das irregularidades apontadas e a fim de impedir a realização de despesas públicas com a contratação de pessoal de maneira ilegal, ilegítima e antieconômica, que coloca em risco o exercício da atividade de arrecadação e fiscalização da Sefaz, o Ministério Público de Contas pede a concessão de medida cautelar ao Tribunal de Contas para suspender a cláusula IV do item 5.1 do edital 03/2016, não permitindo que as vagas dos cargos de chefia da Sefaz sejam preenchidas por candidatos não concursados, até julgamento final do processo TC 9197/2016.

Ao final, o MPC pede que, após a apresentação de justificativas e defesa dos responsáveis, seja reconhecida a inconstitucionalidade da Lei Complementar 832/2016 e seja declarada a nulidade da cláusula 5.1, IV, do edital 03/2016, em razão das irregularidades que representam burla ao concurso público, violação à exigência constitucional de a administração tributária ser exercida por servidores de carreira específica e a possibilidade de delegação de poder de polícia a agente portador de vínculo precário com a administração, além da condenação do secretário ao pagamento de multa.

Veja a íntegra da Representação TC 9197/2016