Decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirma entendimento detalhado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no final de 2023 em repercussão geral e esclarece que cabe à Câmara Municipal o julgamento das contas anuais do prefeito e atos de governo, enquanto o Tribunal de Contas emite parecer prévio; porém, nos casos que tratam de atos de gestão irregulares de prefeito, o Tribunal de Contas permanece competente para julgar e fiscalizar, inclusive aplicar multa e débito, medidas cautelares e outras sanções ao chefe do Executivo
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforçou, em decisão publicada no último dia 16, que os Tribunais de Contas (TCs) são competentes para julgar, fiscalizar e aplicar medidas cautelares, corretivas e sancionatórias a prefeitos, incluindo multa e ressarcimento, sem que essas decisões precisem passar por posterior análise do Poder Legislativo, quando se tratar de irregularidade na prática de ato de gestão do chefe do Executivo.
Nas prestações de contas anuais e atos de governo dos prefeitos, o Tribunal de Contas emite um parecer técnico e cabe ao Poder Legislativo o julgamento, conforme já esclarecido em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) com repercussão geral, desde 2016.
O posicionamento do STJ foi firmado pela Segunda Turma, em sessão realizada no último dia 6, ao julgar novamente recurso ordinário interposto contra decisão do Tribunal de Justiça do Ceará, à luz de tese fixada pelo Supremo sobre a competência dos TCs.
No caso, a Segunda Turma do STJ confirmou o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, que entendeu legítima decisão condenatória do Tribunal de Contas local, com imposição de débito e multa ao recorrente, em razão de irregularidade na prática de ato de gestão pelo prefeito do município, especificamente, a compra superfaturada de um terreno.
Teses fixadas pelo STF sobre o assunto
Em 2016, a Suprema Corte firmou a primeira tese sobre o assunto (Tema 157). Ao julgar o Recurso Extraordinário (RE 729.744), concluiu pela competência exclusiva da Câmara Municipal para o julgamento das contas anuais do prefeito. Na ocasião, foi firmado o entendimento de que o Tribunal de Contas atua como auxiliar do Poder Legislativo, cabendo-lhe apenas a emissão de parecer técnico opinativo, sem força vinculante.
Ainda em 2016, o STF decidiu, por maioria, apreciando o Tema 835 da repercussão geral, que, para fins de aplicação da sanção de inelegibilidade prevista no art. 1.º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar 64/1990, alterado pela LC 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), “a apreciação das contas dos prefeitos, tanto as de governo quanto as de gestão, será feita pelas Câmaras municipais com o auxílio dos Tribunais de Contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de prevalecer por decisão de 2/3 dos vereadores”.
Em dezembro de 2023, ao julgar o ARE 1.436.197, sob o rito da repercussão geral (Tema 1287), o Supremo Tribunal delimitou que a necessidade de manifestação expressa do Poder Legislativo local sobre a aprovação das contas do chefe do Executivo municipal fica restrita às prestações de contas anuais, as chamadas contas de governo. Ficou esclarecido também que em relação às contas de gestão, a deliberação da Câmara Municipal é exigida apenas nos casos em que há análise da inelegibilidade, para fins de registro de candidatura.
Com isso, foi firmada tese esclarecendo que nos demais casos de atos de gestão de prefeito, que não estejam relacionados com análise de inelegibilidade para fins de registro de candidatura (Lei da Ficha Limpa), a competência do Tribunal de Contas “permanece intacta”, mesmo após o julgamento dos Temas 157 e 835.
“No âmbito da tomada de contas especial, é possível a condenação administrativa de Chefes dos Poderes Executivos municipais, estaduais e distrital pelos Tribunais de Contas, quando identificada a responsabilidade pessoal em face de irregularidades no cumprimento de convênios interfederativos de repasse de verbas, sem necessidade de posterior julgamento ou aprovação do ato pelo respectivo Poder Legislativo”. Tese fixada no Tema 1287.
Assim, a Suprema Corte entendeu que é possível que os TCs julguem tomada de contas especial com a possível condenação de prefeito a pagamento de débito, de multa ou outras sanções administrativas previstas em lei, sem posterior confirmação ou julgamento pelo Legislativo municipal.
A partir da fixação dessa tese, cujo acórdão foi publicado em março deste ano, o STJ retomou o julgamento de mandado de segurança sobre o caso do Ceará. Por considerar que a situação está em conformidade com o Tema 1287, manteve a decisão anterior para considerar correta a decisão do Judiciário do Ceará que reconheceu a competência do Tribunal de Contas local para aplicar sanção ao prefeito, seguindo o voto do relator do caso, ministro Teodoro Silva Santos.
Confira na íntegra a decisão do STJ no RMS 13499