Em parecer-vista emitido na auditoria de conformidade realizada no Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases) em 2019, o Ministério Público de Contas (MPC) pede ao Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES) a nulidade do Relatório de Auditoria e de todos os atos subsequentes no Processo 2210/2019, tendo em vista a inobservância de dispositivos constitucionais, das normas do Manual de Auditoria de Conformidade e do Regimento Interno do TCE-ES, devido à ausência de elaboração de matriz de responsabilização, com a consequente adequação do processo para possibilitar o contraditório aos responsáveis pelo Iases.
O MPC narra que, durante a realização da auditoria no Iases, foram constatadas evidências da ocorrência de sete irregularidades graves, tais como: superlotação de unidades de cumprimento de medidas socioeducativas, falhas na execução das políticas educacional e socioeducativa nas unidades socioeducativas, não atendimento a direitos básicos dos adolescentes, ausência ou insuficiência de destinação de recursos, ausência de composição mínima do quadro de pessoal necessário ao atendimento socioeducativo.
A equipe de auditoria, contudo, se limitou a propor determinações e recomendações e não apresentou proposta de encaminhamento contendo a descrição das possíveis responsabilidades individuais e solidárias dos agentes públicos que contribuíram ou deram causa a esses indícios de irregularidades, tratados como achados de auditoria, para que a fase de instrução processual fosse desenvolvida de forma plena.
Da mesma forma, a Instrução Técnica Inicial (ITI) também não apresentou a chamada matriz de responsabilização e apenas ratificou as sugestões presentes no relatório. Em seguida, o relator do caso, conselheiro Rodrigo Coelho, determinou a notificação dos responsáveis para que cumprissem as determinações e recomendações no prazo de 90 dias e apresentassem plano de ação, sob pena de sofrerem as sanções previstas na Lei Orgânica do TCE-ES (Lei Complementar 621/2012) e no Regimento Interno da Corte de Contas.
Depois de notificados, os responsáveis pelo Iases apresentaram questão de ordem pública e alegaram nulidade dos atos processuais por prejuízo à ampla defesa e ao contraditório, além de ausência de manifestação do Ministério Público de Contas no processo. O Plenário do Tribunal de Contas reconheceu apenas o vício processual referente à ausência de manifestação ministerial.
Ao apresentar parecer no caso, o MPC propôs a nulidade do Relatório de Auditoria e de todos os atos subsequentes, com base nas informações levantadas na questão de ordem pública e devido aos graves vícios verificados na tramitação processual, assim como o retorno do processo à fase de elaboração do Relatório de Auditoria, para possibilitar a confecção da matriz de responsabilização, além da conversão da auditoria de conformidade em auditoria operacional, após manifestação plenária.
No voto apresentado na sessão do último dia 7, o relator, Rodrigo Coelho, divergiu da manifestação ministerial e transformou as determinações em recomendações, já que aquelas dependeriam do oferecimento de contraditório, enquanto estas não resultam em sanções e possuem caráter facultativo de cumprimento, portanto, sem qualquer efetividade para solução das irregularidades identificadas.
Por causa da divergência do relator, o MPC solicitou vista dos autos e emitiu o parecer-vista reforçando todos os argumentos apontados na manifestação ministerial anterior.
Irregularidades graves
O órgão ministerial esclarece, no documento, que “sempre que os achados se constituírem em irregularidades, devem ser consignadas, como propostas de encaminhamento, as medidas destinadas ao estabelecimento do contraditório dos responsáveis para completa averiguação acerca da aplicação de sanções”.
Diante disso, o MPC considera imprescindível a confecção da matriz de responsabilização nesse caso, uma vez que foram verificados indícios de sete irregularidades graves na auditoria realizada, além de equivocada e um desprestígio à efetividade da auditoria a proposta de sanar os achados, “consubstanciados em irregularidades graves, agora por intermédio de simples recomendações”.
Para o órgão ministerial, a conversão das determinações em recomendações carece de fundamentação legal e questiona qual seria o efeito prático de se notificar os responsáveis para que cumpram simples recomendações, “meros conselhos do controle externo”, diante dos problemas identificados no Iases pela equipe de auditoria. São eles:
• Não implantação de unidades socioeducativas regionalizadas e de atendimento inicial integradas;
• Espaços e estruturas físicas de unidades socioeducativas sem manutenção adequada;
• Ausência de composição mínima do quadro de pessoal necessário ao atendimento socioeducativo;
• Inexistência de programa institucionalizado de atendimento socioeducativo ao egresso;
• Não atendimento a direitos básicos dos adolescentes;
• Ausência ou insuficiência de destinação de recursos;
• Superlotação de unidades de cumprimento de medidas socioeducativas.
O parecer-vista conclui pela nulidade do Relatório de Auditoria e demais atos subsequentes e a readequação processual para permitir a apresentação de contraditório pelos responsáveis, sob pena de inviabilidade da correção das graves irregularidades, com repercussão, inclusive, em questões de ordem humanitária.
A manifestação foi incluída no processo nesta quarta-feira (19) e deve ser analisada na sessão virtual da 1ª Câmara desta sexta-feira (21).